​​​​4.2 Microcrédito e microfinanças


​O microcrédito representa importante instrumento de inclusão financeira e de desenvolvimento econômico e social. Embora existam diversas definições na literatura, o microcrédito é frequentemente associado a concessão de crédito de pequenos valores a pessoas que não possuem acesso às formas tradicionais oferecidas pelo sistema financeiro. O microcrédito produtivo orientado, particularmente, é voltado a negócios de pequeno porte, gerenciados por pessoas de baixa renda, e caracteriza-se pelo uso de metodologia baseada no relacionamento direto com o empreendedor em seu local de trabalho.

O acesso ao crédito sempre foi obstáculo ao crescimento do setor produtivo nacional, sobretudo para os micro e pequenos empreendimentos, uma vez que os mais pobres são os que mais se defrontam com dificuldades para acessar os produtos e serviços disponibilizados pelo mercado financeiro, em razão da assimetria de informações, dos custos elevados das tarifas e do crédito em suas diversas modalidades.

Com intuito de contornar esses problemas, o governo federal vem, nos últimos anos, produzindo vários incentivos para massificação do microcrédito no país. A oferta de crédito produtivo está sendo ampliada, especialmente a pessoas naturais  e pessoas jurídicas  empreendedoras de atividades produtivas de pequeno porte, de forma que se incentive a geração de trabalho e renda entre os microempreendedores populares.​


4.2.1 Novos marcos regulatórios

O aperfeiçoamento das normas referentes ao microcrédito
contribuiu para dar novo estímulo ao setor.

Apesar da evolução normativa (ver box no fim da seção), a inexistência de definição no campo regulatório sobre microcrédito e a impossibilidade de conhecimento da carteira total desse tipo de operação eram apontadas por organismos internacionais como um dos principais problemas do Brasil quanto ao tema. Em 2011, o Global Microscope on Microfinance Business Environment 201115 indicava que "a regulação sobre microfinanças no Brasil continua subdesenvolvida". Os avaliadores advertiam, à época, que, no país, "a única definição operacional do microcrédito aplica-se aos recursos que bancos e instituições financeiras tradicionais devem direcionar a fins sociais".

Para sanar essa deficiência e dar melhor qualidade à expansão do acesso ao crédito para empreendedores de baixa renda, o Conselho Monetário Nacional (CMN) editou as Resoluções CMN nº 4.152 e nº 4.153, ambas de 30 de outubro de 2012.

A Resolução nº 4.152, de 2012, estabeleceu a definição de microcrédito como sendo o crédito concedido a empreendedores urbanos ou rurais pessoas naturais ou pessoas jurídicas que utiliza equipe especializada, encarregada de acompanhar a operação durante o período do contrato, no local onde é executada a atividade econômica do tomador, e metodologia específica, que abrange:

(i) avaliação dos riscos da operação, considerando a necessidade de crédito, o endividamento e a capacidade de pagamento de cada tomador; 

(ii) análise de suas receitas e despesas, no caso de tomadores individuais; 

(iii) mecanismo de controle e acompanhamento diário do volume de crédito concedido e da inadimplência das operações da instituição. 

A Resolução CMN nº 4.153, de 2012, por sua vez, aperfeiçoou pontos da Resolução CMN nº 4.000, de 25 de agosto de 2011, sobre as regras do direcionamento obrigatório de depósitos à vista para operações com população de baixa renda e microempreendedores, previsto pela Lei nº 10.735, de 11 de setembro de 2003. A resolução trouxe as seguintes alterações:​

  • exclusão das operações inadimplentes ou em atraso superior a sessenta dias do cálculo para cumprimento do direcionamento obrigatório, como forma de incentivar a responsabilidade na concessão das operações e a qualidade e a sustentabilidade da carteira;
  • aumento do teto do saldo devedor do microempreendedor para adequação à nova realidade socioeconômica brasileira;
  • permissão para procedimentos simplificados de confecção de ficha cadastral e elaboração do contrato representativo da dívida;
  • fixação de limite de R$40 mil para o somatório das operações de microcrédito com o saldo de outras operações de crédito, excetuadas as de crédito habitacional, para evitar o superendividamento dos tomadores de microcrédito;
  • inclusão do crédito concedido a cooperativas singulares de crédito, Sociedades de Crédito ao Microempreendedor e à Empresa de Pequeno Porte (SCMEPP) no cálculo do cumprimento da exigibilidade das operações de crédito destinadas aos microempreendedores e à população de baixa renda, reforçando o financiamento das operações dessas instituições.

Assim, as novas normas (resumidas na tabela seguinte) harmonizaram a definição de microcrédito e criaram condições para acompanhamento contábil da carteira no Brasil.

Resolução CMN nº 4.152, de 30 de outubro de 2012

Disciplina as operações de microcrédito e define metodologia específica.

Resolução CMN nº 4.153, de 30 de outubro de 2012

Altera a Resolução nº 4.000, de 2011, que dispõe sobre a realização de operações de microcrédito destinadas à população de baixa renda e aos microempreendedores.

Carta-Circular Banco Central nº 3.606, de 5 de julho de 2013

Cria rubricas contábeis e altera títulos e subtítulos do Plano Contábil das Instituições do Sistema Financeiro Nacional (Cosif) para registro dos valores relativos à aplicação em operações de microcrédito.

 

Evolução normativa do microcrédito

Normativo​

Avanços para o microcrédito

Lei nº 9.790, de 23 de março de 1999

Inclui o microcrédito como uma das finalidades das Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs).

Lei nº 10.194, de 14 de fevereiro de 2001

Institui as Sociedades de Crédito ao Microempreendedor. 16

Lei nº 10.735, de 11 de setembro de 2003

​Estabelece o direcionamento de parte dos depósitos à vista captados pelas instituições financeiras para operações de crédito destinadas a microempreendedores e pessoas naturais de baixa renda ou detentoras de aplicações financeiras de pequeno valor. O crédito poderia ter como finalidade o consumo ou o financiamento de atividades produtivas.

Lei nº 11.110, de 25 de abril de 2005

Institui o Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO), com o objetivo de propiciar o arcabouço técnico-    -legal consistente para facilitar e ampliar o acesso ao crédito produtivo e orientado aos microempreendedores.

Resolução CMN nº 3.422, de 1º de dezembro de 2006

Regulamenta a Lei nº 10.735, de 2003. Fixa em, no mínimo, 2% o percentual dos depósitos a vista a ser aplicado em operações de microcrédito. Em caso de não aplicação, esses recursos devem ser recolhidos ao BCB sem remuneração. Válido para depósitos captados por bancos comerciais, bancos múltiplos com carteira comercial e Caixa Econômica Federal.

Resolução CMN nº 4.000, 25 de agosto de 2011

Substitui a Resolução CMN nº 3.422, de 2006. Determina que, do total dos 2% de depósitos a vista direcionados ao microcrédito, um percentual mínimo seja destinado ao microcrédito produtivo orientado. Esse percentual foi estabelecido de forma escalonada, até chegar a 80% do total da exigibilidade, a partir de 1º de julho de 2013.

Circular Banco Central nº 3.566, de 8 de dezembro de 2011

Define critérios para aferição do cumprimento de exigibilidade de aplicação dos depósitos à vista em operações de microcrédito e estabelece procedimentos para remessas de informações relativas a essas operações.




¹⁵ Estudo conduzido pela Economist Intelligence Unit, com financiamento do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), da International Finance Corporation (IFC) e da Corporação Andina de Fomento.
¹⁶ Posteriormente alterada pela Lei 11.524, de 24 de setembro de 2007, modificando a denominação das Sociedades de Crédito ao Microempreendedor (SCM) para Sociedades de Crédito ao Microempreendedor e à Empresa de Pequeno porte (SCMEPP), com a alteração do escopo de sua atuação.